Minha infância foi cercada de gastronomia literária, ou seria poesia gastronômica?
Mais tarde, enveredei pela química, mas os aromas de laboratório me desagradavam e a abandonei. Busquei depois a administração na tentativa vã de organizar minhas idéias e sentimentos tresloucados, de projetos mirabolantes que jamais se concretizaram.
Durante os anos em que transitei por diferentes escritórios, tão cinzentos quanto suas rotinas, cheios de pessoas cujos rostos me pareciam tão iguais, quando um por do sol nada mais era do que uma vaga noção, cozinhar era a forma de me abstrair e de me consolar.
Finalmente, após anos de prisão voluntária, consegui me libertar de minha sombria carreira administrativa e pude permanecer junto ao calor de meu fogão.
Iniciou-se então minha entrada na profissão de cozinheira.
Devo confessar que não começou lá muito bem. Houve um sinistro episódio relativo a uma malfadada encomenda de 300 bolinhos vermelhos em forma de coração...
Bem, isto é uma longa história que fica para depois.
Neste instante preciso fazer um pequeno aparte para elucidar a origem de meu conhecimento culinário. Assim como tantos que perseguem um objetivo sem dispor dos meios para abreviar o caminho, aprendi com o método empírico que a vida nos ensina. Fazendo e refazendo, até dominar a rebeldia das claras em neve, e penetrar nos obscuros mistérios por trás do crescimento dos suflês. Muito me valeram, então, meus conhecimentos de química enquanto me perdia nos vapores da alquimia gastronômica. Embora eu tenha um lado "perua", muitas vezes suspirei diante de vitrines cheias de assessórios e brilhos, trocados por livros e pelo brilho de panelas e outros utensílios. Foram muitos anos de descobertas, fruto de infinitas tentativas. É claro que não cozinhava para mim, porém para Rodrigo, objeto de minha maior afeição, incentivador, crítico implacável e cobaia temerária de minhas experiências.
Bem, comecei a fazer pequenos jantares e a fazer doces e tortas, por encomenda. Em pouco tempo, várias pessoas vieram a mim pedindo que desse aulas, e mais e mais pediam jantares.
Fui proprietária e chefe da cozinha de um pequenino bistrô perdido na Barra. Por 10 anos desbravei os sertões culinários daquela região, onde os clientes vinham de longe, conhecer minha cozinha. Lá conheci clientes que se tornaram amigos, fui festejada e festejei a alegria de compartilhar bons momentos com todos que por lá passaram.
Daquela época para cá, minha vida transformou-se numa sucessão de eventos que me trouxeram até onde hoje estou.
Quando olho para trás, vejo um desfile interminável de rostos sorridentes, ouço o murmurinho das conversas, e o barulho dos copos e pratos servidos, e penso em todas as noites em que trabalhei até tarde, nos pés cansados e costas doídas e não me arrependo nem um pouco. Ao contrário: me vem ao peito uma sensação eufôrica de dever cumprido, e mais vontade de seguir em frente.
Quanto ao resto:
Minha cor predileta: azul
Minha Pasta de dente: a que comprarem
Hobby: Leitura e cozinhar
Livro de cabeceira: Livros de receita e Cem Anos de Solidão
Música: Rock, acid jazz e no momento Tango
Bebida predileta; Vinhos, brancos e tintos. ( Champagne, é claro)
Comida predileta: farofa
Ingrediente predileto: sal
O que levaria para uma ilha deserta: O manual de escoteiros dos sobrinhos do Donald e protetor solar.
O que deixaria lá: Os meus fracassos
Maior defeito: teimosia
Maior qualidade: perseverança
PS: Se o que escrevi a meu respeito não é suficiente, posso me resumir na seguinte frase: Nada mais sou do que uma cozinheira sonhadora.